Jantar beneficente leva dignidade e esperança à população de rua do Recife neste Natal

Nesta véspera de Natal, uma iniciativa que se repete há nove anos novamente tomou forma no Centro de Recife. O jantar beneficente da ONG Anjos da Noite, fundada em 2011, atendeu cerca de mil pessoas em situação de rua e vulnerabilidade social nesta terça-feira (24), na Praça da Independência, conhecida como “Praça do Diário”. A celebração natalina dá continuidade ao trabalho diário já realizado por voluntários da organização, que opera com endereço fixo na região central da cidade.

A fundadora e presidente da Anjos da Noite é a condutora e socorrista do Samu Camaragibe, Conceição Rodrigues, de 48 anos. A mobilizadora social explica que a ONG trabalha todos os dias na Rua da Conceição, no bairro da Boa Vista, entregando refeições a cerca de 300 pessoas de segunda a sábado e, aos domingos, expande a iniciativa para aproximadamente 500 pessoas. O jantar acontece há nove anos, mas a instituição já opera há 13.

“Todas as datas comemorativas celebramos com eles. Especificamente no Natal, a gente vem para a Praça do Diário, porque mais pessoas vêm. O objetivo da nossa ceia é justamente refletir ‘Se nós temos, por que eles não?’. Isso os dá um pouco mais de dignidade. Se todos os dias eles sentam conosco, por que não, numa data tão especial, não ter essa simbologia deles todos sentados, em ceia, esperando?”, refletiu Conceição, carinhosamente apelidada de “Cecinha”.

Ainda de acordo com a idealizadora, trabalhar com a população em vulnerabilidade traz muitos desafios. Seja para angariar fundos e suprimentos, seja para lidar com as especificidades de quem vive os perigos da rua.

“A gente vive de doação, mas graças a Deus, nunca nos faltou. Como a gente serve na hora, em alguns dias tem um pouco mais, em outros, a fila está grande e precisamos servir menos. Mas adquirimos o respeito deles, eles nos conhecem por nome. Aqui, no Natal, nós unimos duas comunidades que, no dia a dia, são rivais, não podem se juntar. Porém, a gente consegue uni-los na ceia”, acrescentou a organizadora.

Histórias de quem ocupa as ruas do Centro

À espera do jantar de Natal desde as 15h desta terça-feira, Evandro Cordeiro, de 55 anos, contou um pouco de sua história para o LeiaJá. Diabético, com mobilidade reduzida e diversos problemas vasculares, ele perambula pelo Centro do Recife com uma muleta e tenta conseguir o pão de cada dia. Cordeiro conta que não é sem-teto, mas que o dinheiro só dá para o aluguel de uma moradia popular. Ele foi parar na rua aos 45 anos.

“Aqui eu rodo tudo, não tenho lugar fixo. Vim parar na rua há 10 anos, desde que perdi minha mãe. Ela faleceu, perdi o direito à casa dela e fiquei sem opção, fiquei perdido no mundo. Não vim para cá por vício, não uso nada. Tenho benefício e pago um aluguel de R$ 300 no Ipsep, mas não consigo me virar com o resto. Remédio, comida”, contou.

Caso não estivesse fazendo parte da ceia da Anjos da Noite, Evandro não sabe dizer o que estaria comendo na ceia, nem se teria conseguido algo para comer. “Isso aqui é uma dádiva de Deus. Por isso o nome, Anjos da Noite, pois só anjos para cuidar de pessoas desfavorecidas, invisíveis. Pela sociedade, consideradas indigentes. Quando nos veem nas ruas, escondem o celular e pensam que serão roubados, mas aqui tem cidadãos. Tem muita gente direita que, apesar da injustiça da vida, não deixa de ser cidadão, ser humano, e que deve ser olhado como Deus olha para nós. Se eu não estivesse aqui, não sei o que eu teria para comer hoje”, completou.

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