Onça-parda encara próprio reflexo em espelho de monitoramento na Mata Atlântica


Ao ver a si mesmo, macho reage de forma agressiva com rosnado e batida de patas, como se quisesse “medir o oponente”. Onça-parda reage de forma agressiva ao ver seu próprio reflexo em espelho de monitoramento comportamental
Projeto Aventura Animal
Uma cena rara foi registrada na Reserva Ecológica de Guapiaçu (REGUA), na parte alta da Mata Atlântica, no início do mês de novembro: uma onça-parda reagiu intensamente ao ver seu próprio reflexo em um espelho, uma ferramenta utilizada para monitoramento comportamental.
O registro, feito pelo projeto Aventura Animal, faz parte da pesquisa de comportamento desenvolvida pelo biólogo Yan Rodrigues, do Caminho da Mata Atlântica, que estuda esses animais há muito tempo na região.
O espelho foi idealizado por Juran Santos, em parceria com a RPPN REGUA, e é utilizado para compreender se alguns animais possuem a capacidade de se reconhecer no reflexo e, no caso das onças-pardas, como elas não se reconhecem, investigar se elas reagem ao próprio reflexo, permitindo novas observações sobre a territorialidade e interações sociais dessa espécie.
O comportamento da onça-parda surpreendeu a equipe de pesquisadores. Segundo Yan, a maioria dos animais observa o espelho com curiosidade ou até evita o reflexo, especialmente os indivíduos mais jovens.
Mas, neste caso, a onça reagiu de forma agressiva, como se estivesse “medindo o oponente” e evidenciando sinais de disputa territorial, como rosnados, bufadas e batidas de patas (veja vídeo).
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O biólogo explica que a pesquisa tem mostrado que as onças adultas exibem esse tipo de comportamento mais intenso, enquanto as jovens costumam hesitar diante do reflexo.
A importância desse registro para a psicologia do animal é que ele nos permite entender parcialmente a psique evolutiva da espécie, demonstrando que, de fato, as onças-pardas não possuem a capacidade de se reconhecer no reflexo. Além disso, evitam passar perto novamente do espelho
Ainda de acordo com o pesquisador, o valor desse estudo é imenso, pois agora sabem exatamente como essas disputas ocorrem, como elas variam entre os indivíduos e as fases de aviso que antecedem um confronto – detalhes que raramente se observa na natureza.
Espelho é utilizado para compreender se alguns animais possuem capacidade de se reconhecer no reflexo e como reagem
Projeto Aventura Animal
Yan destaca que esse comportamento negativo ao espelho já foi observado em outros casos, mas os detalhes capturados por eles são inéditos.
“Nos indivíduos adultos, vemos que a reação ao reflexo inclui um ‘pré-confronto’, onde o animal mede o oponente antes de atacar, uma disputa que normalmente ocorre de forma invisível na natureza,” reforça Yan.
Socialização e comportamentos reprodutivos
O uso do espelho tem como objetivo entender não apenas a territorialidade, mas também questões relacionadas à socialização e ao comportamento reprodutivo das onças-pardas.
Macho reagiu como se estivesse “medindo o oponente”, evidenciando sinais de disputa territorial
Projeto Aventura Animal
Em épocas de acasalamento, o pesquisador conta que as fêmeas demonstram comportamentos de cortejo diante do espelho, um detalhe raro de se captar no ambiente selvagem.
“Queremos observar esses comportamentos em detalhes, pois eles são difíceis de presenciar ao ar livre. O espelho nos permite um novo nível de estudo desses felinos,” acrescenta Yan.
O espelho de monitoramento
Os desafios para levar adiante esse projeto são grandes, desde a logística complexa em um terreno com altitudes que variam de cem a mais de mil metros, até o peso e a fragilidade dos equipamentos.
“O espelho que usamos pesa mais de 100 kg e foi carregado por 8 km com a ajuda de parceiros do projeto Aventura Animal. Ele é feito de películas especiais para evitar que quebre e se estilhace”.
Indivíduo ainda rosnou e bateu as patas
Projeto Aventura Animal
Além disso, o monitoramento exige uma equipe extensa e financiamento contínuo, especialmente para rastrear o movimento das onças e entender melhor seus territórios e dietas.
O projeto tem objetivos a longo prazo, como a catalogação de comportamentos raros e o desenvolvimento de políticas de conservação específicas para a espécie na Mata Atlântica.
A equipe, em colaboração com parceiros como a WWF, também trabalha no reflorestamento da Serra do Mar no Rio de Janeiro, criando corredores ecológicos que favorecem a preservação de mamíferos de grande porte e incentivam o ecoturismo na região.
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